quarta-feira, 28 de novembro de 2012

“Não sei o que fazer mais não” , chora agricultor que sofre com a seca


Criador diz que já vendeu gado pela metade do preço e adquiriu dívidas para manter a propriedade
Foto: Roberto Lima

Enquanto alguns ‘veteranos das secas’ relembram casos de estiagem que marcaram a Paraíba no passado, outros contam o drama do sofrimento que estão vivendo este ano. Luis Cordeiro, 67 anos, mora no sitio Queimadas, distante 10 quilômetros de Monteiro, no Cariri, e já está perdendo as esperanças por dias melhores.

A luta diária para minimizar os efeitos da seca em sua propriedade fez com que o idoso contraísse débitos financeiros, algo que sempre fez questão de não ter. “Vendi cinco cabeças de gado por menos da metade do preço e outras cinco morreram. Só tenho agora 40 cabeças passando fome. Gasto por mês cerca de R$ 1,8 mil, mas do que meu salário e de minha esposa juntos. Tô queimando uns restos de xique-xique que percorro quilômetros pra encontrar. Sei o que fazer mais não. Nunca me deparei com uma situação dessa, devendo e vendo os bichos morrerem”, lamentou.

A destruição causada pela seca não traz somente problemas financeiros para os moradores das cidades mais afetadas. Os danos também contribuem para um sentimento de fracasso, revolta e dor, sobretudo nos criadores rurais que são obrigados a assistir a morte de seus animais ou mesmo ter que vendê-los.

Na propriedade de José Rivaldo Moraes, 60, no sitio Pocinhos, zona rural de Monteiro, o filho dele não aguentou a seca e foi embora em busca de melhores condições de vida em São Paulo. Doente, vítima de problemas cardíacos e deficiente de um braço, ele reclama que não tem mais força para enfrentar a seca e a sorte da família é a mulher dele, Maria Eunice Barbosa. 50, que é responsável por cuidar dos trabalhos na roça. Eles sobrevivem com uma renda de R$102, do programa Bolsa Família. “Não entendo mais isso que está acontecendo não. È muita desgraça para um tempo só”, lamenta.

O vizinho dele, Edilson Leonardo Moraes, 49, disse que já começa a sentir incapaz de lutar contra os problemas e que conta com ajuda do filho Anderson Moraes, 10, para dar conta das últimas cabeças de gado que sobraram no curral. “Vou levando até onde puder, quando não tiver mais forças para aguentar, nem sei o que será de mim. Muito triste acordar e não ter o que dar para o gado comer. Ver os animais agonizando até a morte, em sua plena inocência. Só Deus para tirar a gente dessa situação calamitosa”, ressaltou.

O produtor rural Carlos Luciano da Silva, 49, possuía o maior rebanho bovino do município do Congo, com mais de 400 rezes. Com a falta de água e alimento para os animais, ele teve que vender a metade e teme ter que se desfazer dos que restam no curral. “Não tenho coragem de ver nenhum do meu rebanho morrer de fome e por isso, prefiro vender até por menos da metade do preço. Não é somente o prejuízo financeiro que nos comove, mas também o sentimento afetivo que temos por nossas criações”, disse.

Seca expulsa jovens e separa famílias

A seca deste ano não tem somente destruído os campos, vegetação e matado animais. Ela também tem provocado a separação de familiares, sobretudo os jovens, que estão deixando pais e irmãos em busca de melhores condições de vida, no Sudeste do país. Pelo menos 4 mil já deixaram as regiões do Cariri e Sertão da Paraíba, para trabalhar em outras lavouras como a de cana-de-açucar no interior paulista. Outros migram em busca de emprego nos grandes centros urbanos, como Rio de Janeiro e São Paulo.

Monteiro é uma das cidades de onde mais saem jovens para o Sudeste. São José de Caiana, Cachoeira dos Índios, Nazarezinho, Serra Grande, Sousa, Princesa Isabel, Juru, Monteiro, Teixeira e Água Branca também são campeões no êxodo. Por isso, o número de residências abandonadas nas comunidades rurais é grande.

Para os pais, apesar da saudade, a partida dos filhos tem sido a saída e para conseguir driblar as dificuldades. O filho de José Rivaldo Moraes, 60, deixou a casa no começo deste ano para se arriscar na área de construção civil, em São Paulo. “Graças a ele, ainda estamos conseguindo manter umas cabeças de gado, porque com o dinheiro que ele nos manda, eu compro milho. Na nossa casa, só entra esse dinheiro que ele manda e que não é muito porque ele tem as despesas em São Paulo e o Bolsa Família. Se não fosse isso, já tinha morrido todo mundo de fome”, ressaltou.

Obra parada é frustração

As obras da transposição do Rio São Francisco, que poderiam ser motivo para animar paraibanos atingidos pela seca, estão causando ainda mais frustração. Paralisadas em praticamente todos os lotes que integram os eixos Norte e Leste, os canais que chegaram a ser construídos, estão se deteriorando. O lote 12, que sai de Sertânia (PE), estava previsto para chegar em Monteiro, no final deste ano. No entanto, as obras foram interrompidas numa distância de pelo menos 10 Kms e sequer chegaram à divisa estadual.

“Agora, parada do jeito que está, quando decidirem retomar essas obras, ao invés de começaram de onde pararam, terão que voltar, refazendo muitas coisas porque está se destruindo”, relatou o vice-prefeito eleito da cidade, Carlos Eduardo Menezes.

O eixo leste da transposição possui 287 quilômetros de extensão e conforme informações do o Ministério da Integração Nacional (MIN), repassadas no começo deste semestre, as obras já estavam mais de 70% executadas, mas, atualmente, o que se vê nos trechos é abandono.

“Não tenho mais fé que essa transposição saia não. O que se ouve é que a prioridade são investimentos em outras obras, como as da Copa do Mundo. É revoltante ver esse canal se quebrando todo e não correr água nele ainda pra matar a sede do povo”, diz o agricultor José Rivaldo. A última previsão do MIN é que a transposição deveria ser concluída até o final de 2015.

Açude de Coremas

Maior da Paraíba e o 4º maior reservatório público do País – está com apenas 47,49% de sua capacidade de armazenamento. O manancial já baixou 4,38 metros cúbicos e perdeu 12 KMs de extensão de água, por causa dos efeitos da estiagem prolongada. O Departamento Nacional de Obras contra Seca (Dnocs) estima que, mesmo que não ocorram chuvas, a quantidade de água existente é suficiente para o abastecimento até o final de 2014. Mas, moradores de 16 cidades temem racionamento.

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